A competência para julgar a greve de servidores públicos celetistas da Administração Pública Direta, Autárquica ou Fundacional passou para a Justiça Comum

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Advogado: 

Danilo Uler Corregliano

Ano: 

2 017

No dia 1º de agosto de 2017, o STF concluiu o julgamento do Recurso Extraordinário nº 846.854, cuja relatoria ficara a cargo do Min. Luiz Fux, fixando o seguinte Tema nº 544 de Repercussão Geral: "A justiça comum, federal ou estadual, é competente para julgar a abusividade de greve de servidores públicos celetistas da Administração pública direta, autarquias e fundações públicas[1]". Ou seja, trabalhadores com registro na carteira de trabalho de Municípios, de Estados, da União, de fundações públicas (como a Fundação Casa e o Procon no estado de São Paulo) e de autarquias que fizerem greve, serão julgados pela Justiça Comum estadual ou federal.

Este processo surgiu do Dissídio coletivo nº 2030400-40.2007.5.02.0000, em que a Federação Estadual dos Trabalhadores da Administração do Serviço Público Municipal (FETAM) litigava em face do Município de São Bernardo do Campo.

A solução não passa desapercebida, eis que em flagrante contradição com a literalidade do art. 114, II da Constituição Federal, mediante o qual compete à Justiça do Trabalho processar e julgar “as ações que envolvam exercício do direito de greve”.

O relatório ainda será redigido e publicado. Porém, pelo resultado publicado, vê-se que os trabalhadores sofreram uma possível nova derrota no STF, que há algum tempo já vem desnutrindo a competência da Justiça do Trabalho, como o deslocamento para a Justiça Comum das ações envolvendo previdência complementar privada que decorre de vínculos empregatícios (REs 586.453 e 583.050). No caso da previdência complementar, a alteração da competência inverteu a jurisprudência dominante do TST que era favorável aos trabalhadores, como as ações que envolviam a Petrus (previdência dos trabalhadores da Petrobrás).

Trata-se de novo golpe ao direito dos trabalhadores, porque sabemos que a Justiça Comum não é preparada para apreciar as relações de trabalho subordinado celetista, onde vigoram princípios especiais que não se aplicam à esfera cível. O princípio protetivo do trabalhador talvez seja o mais significativo, e o julgamento da abusividade da greve sempre esbarra em direitos individuais dos trabalhadores, que sopesam a decisão a ser tomada.

De todo modo, não sabemos como a Justiça Comum irá apreciar os pedidos de abusividade da greve dos servidores celetistas. Apesar da tendência mais formalista, nada está definido, até porque a Justiça Comum já julgava estes processos antes de 2004.

Há ainda uma complicação adicional. Via de regra, os empregadores públicos não se mostram favoráveis às negociações coletivas de trabalho, apostando na ausência do comum acordo para a extinção dos dissídios coletivos ingressados pelos sindicatos de trabalhadores. Porém, quando irrompe uma greve e o Poder Público ingressa com uma ação inibitória com vistas a declarar a abusividade do movimento grevista, a Justiça do Trabalho tende a julgar as cláusulas sociais e econômicas (nos casos de mera reposição inflacionária), do dissídio instaurado.

Com este deslocamento de competência, não sabemos ainda se a Justiça Comum julgará os dissídios coletivos (o que seria um contrassenso) ou se o processo será dividido, sendo a abusividade da greve julgada pela Justiça Comum e o dissídio coletivo julgado pela Justiça do Trabalho (outro contrassenso). Assim, a solução do STF não parece ter atendido a nenhuma lógica jurídica, senão ao imperativo de precarizar ainda mais as relações de trabalho – a suspensão da Súmula nº 277 figurou como um sintomático exemplo desta nova postura da mais alta Corte do país[2].

Como alguns já vem dizendo, estamos assistindo o golpe dentro do golpe. Aliado aos mecanismos perniciosos da reforma trabalhista (Lei nº 13.467/17), parece mesmo que os poderes da República estão promovendo uma jornada contra os direitos dos trabalhadores, em nome apenas das taxas de lucro das empresas. E de modo cada vez mais escancarado.

Desde a edição da Emenda Constitucional nº 45/2004, o dissídio coletivo de natureza econômica passou a depender do comum acordo entre as partes. Isto foi um desastre para o setor público, onde os empregadores não encontram nenhuma pressão para a negociação das condições de trabalho, senão a greve.

Porém, o STF vem há algum tempo restringindo o direito de greve dos servidores públicos, como no RE 693.456 (que autoriza o desconto dos dias parados, uma vez que a greve seria “uma opção de risco”) e na Reclamação 24.597 (que negou o direito de greve aos servidores da saúde em geral e do Judiciário).

Com poucas possibilidades jurídicas de exercer a greve, e com restritas possibilidades fáticas de negociar, os empregados públicos estão sendo “encurralados” nesta nova etapa de espoliação do trabalho no Brasil. Possivelmente porque é sabido que o setor público consegue realizar greves de maior duração – segundo o DIEESE, em 2013, 38,8% das greves partiram do funcionalismo público, representando 65,7% do total de horas paradas[3].

Impossibilitando este setor a melhorar as suas condições de trabalho, os poderes constituídos não deixam outra opção senão a desobediência civil. No próximo período, veremos se as organizações da classe trabalhadora e a própria classe estarão preparadas para este novo momento da política nacional.

 

 



[2] Tivemos oportunidade de discutir esta questão em http://www.mflip.com.br/pub/escolajudicial/?numero=57&edicao=10253.

[3] DIEESE. Balanço das greves em 2013. In: Estudos e pesquisas. n. 79. São Paulo: Dieese, dez./2015, p. 3. Disponível em http://www.dieese.org.br/balancodasgreves/2013/estPesq79balancogreves201....